A inédita reeleição por unanimidade para a presidência da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) consolidou o deputado Rodrigo Bacellar, que dirige o União Brasil no estado, como principal nome do grupo do governador Cláudio Castro (PL) para a sucessão no Palácio Guanabara. Bacellar tem falado abertamente sobre a possibilidade com aliados, mas sabe que a impopularidade do atual governo é um empecilho. Ele impõe outras condições para se sentir habilitado à disputa, como estar sentado na cadeira de governador durante a eleição — o que exige uma série de costuras complexas, sobretudo com o atual vice, Thiago Pampolha (MDB), também interessado em concorrer.
Bacellar recebeu 70 votos na segunda-feira e foi reconduzido ao comando do Legislativo. Ninguém votou contra, tampouco se absteve. Com base em acordos com a oposição, abocanhou até votos do PSOL e do PSD do prefeito do Rio, Eduardo Paes, provável adversário na eleição para governador. A vitória expressiva é lida como um sinal de que o parlamentar, sempre apontado como político duro e temperamental, conseguiu “unir a política” nos últimos meses.
Entre os nomes elencados como possíveis candidatos governistas, ele é quem desponta hoje como o mais avançado. Além dos movimentos locais, fez o gesto de “beijar a mão” do ex-presidente Jair Bolsonaro, sem o qual nenhum pré-candidato se viabiliza à direita.
— Sou muito grato pela lembrança do meu nome para projetos maiores. Se for em prol do grupo, para qualquer nome, estou dentro e vou até o final — disse na sessão em que foi reeleito.
Outro com anseio de entrar na eleição, o presidente estadual do MDB e secretário de Transportes, Washington Reis, é o favorito da família Bolsonaro, mas está inelegível por causa de uma condenação por crime ambiental, e o relator do caso em Brasília é o ministro Flávio Dino, indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) por Lula (PT).
Paes mira em Castro
Na visão de Bacellar, é fundamental concorrer ao cargo já estando na cadeira e tendo a máquina nas mãos. A equação é complexa: além de Castro se desincompatibilizar para disputar o Senado, o que tende a ocorrer, Pampolha também precisaria abrir mão do comando do estado e passar o posto para o presidente da Alerj. Só que o emedebista se coloca como candidato natural ao governo e faz seus movimentos para se viabilizar.
Foi ventilada a hipótese de Pampolha ganhar uma cadeira no Tribunal de Contas do Estado (TCE), mas o político de 37 anos não demonstra interesse no cargo. Outro acordo envolveria o emedebista abrir mão de tentar se reeleger no Guanabara, depois que Castro sair, e renunciar para concorrer a deputado. Hoje, no entanto, nenhum acordo está avançado, e a desconfiança entre as partes é notória.
Conforme noticiou a newsletter Jogo Político, do GLOBO, a briga interna promete ser dura. Pampolha soube que adversários estão começando a fazer um pente-fino nos postos de gasolina da família e em autuações que receberam por irregularidades contra o meio ambiente.
Outro obstáculo para Bacellar é a própria situação do estado, sobretudo na segurança pública. Provável candidato de oposição, Eduardo Paes tem explorado cada vez mais o tema, que em pesquisas internas é apontado como preocupação para mais da metade dos fluminenses. Há o temor de que o prefeito faça de Castro uma espécie de candidato oculto, a fim de explorar a rejeição ao governador e associá-lo a Bacellar. Assim, repetiria de certa forma o que fez na reeleição municipal, quando rebateu críticas de Alexandre Ramagem (PL) pintando o bolsonarista como “apadrinhado” de Castro.
A aposta no grupo governista é de melhora na avaliação até o ano que vem, que seria motivada especialmente pelos mais de R$ 10 bilhões aguardados com a futura outorga da concessão do gás no estado. Com alto índice de “regular” nas pesquisas internas, o Guanabara conta ainda com uma ampla rede de prefeitos na Região Metropolitana e no interior para tentar neutralizar a fortaleza de Paes, a capital, onde se espera que o prefeito vença por margem considerável.
Na cúpula do estado, a torcida é para que Lula seja candidato à reeleição, já que a sólida aliança entre o presidente e o prefeito faria Paes permanecer vinculado ao petista. Sondagens mostram que a aprovação de Lula no estado está baixa, e explorar o vínculo entre os dois é peça central da tentativa de minar o favoritismo do prefeito.
O grupo de Castro também faz cálculos em caso de desistência do petista em concorrer à reeleição. Com isso, cresceria a possibilidade de o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), encarar a eleição nacional contra outro candidato do PT. Tarcísio conta, na sua administração, com o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab. Assim, Paes perderia o ônus de estar com o PT num estado que se mostra antipetista e muito afeito a valores da direita.
Aceno ao PP
Logo após a última eleição municipal, Paes acusou Bacellar, em entrevista ao GLOBO, de “ameaças e extorsões” na relação com Castro. Em resposta, foi chamado de “vagabundo” no plenário da Alerj.
Poucos dias depois, um gesto de Bacellar o ajudou a retomar a confiança de outros caciques locais que também demonstravam insatisfação com sua forma de fazer política, mas a manifestavam apenas reservadamente. Depois que o deputado federal Dr. Luizinho, presidente do PP no Rio, viu-se enfraquecido pelo escândalo dos transplantes infectados com HIV na rede estadual de Saúde — seu filão no governo —, Bacellar neutralizou a possibilidade de abrir uma CPI sobre o caso.
O PP só perde para o PL em número de prefeituras no Rio e é cobiçado por Paes para o ano que vem. Avançar sobre o grupo de partidos que dá sustentação ao governo Castro é fundamental para o prefeito não construir uma aliança limitada à centro-esquerda.